
Com suas palavras, não apenas Sacerdotisa, mas o anão e o homem-lagarto se inclinaram para olhar.
Um pergaminho mágico. Um item por vezes encontrado em ruínas antigas, embora muito raramente. O desenrole, e até mesmo uma criança poderia lançar a magia escrita nele. O conhecimento de como os fazer foi há muito perdido, mesmo o mais velho dos alto-elfos não sabia. Os itens mágicos eram bastante raros, mas tais pergaminhos estavam entre os mais raros de todos.
Não obstante, eles eram itens surpreendentemente inconvenientes para aventureiros. Qualquer uma de uma variedade infinita de magias poderia ser escrito neles, do mais útil ao mais mundano, e eles poderiam ser utilizados apenas uma vez, a propósito. Muitos aventureiros simplesmente os vendiam — por uma boa quantia — para pesquisadores ou colecionadores de raridades. Um mago no grupo era mágico o bastante para eles. Eles precisavam mais de dinheiro do que pergaminhos.
Matador de Goblins era um dos poucos que mantinha seu pergaminho. Mesmo Sacerdotisa não sabia que ele o tinha.
— Tudo bem, tudo bem. Eu não tocarei, nem mesmo olharei, mas você pelo menos poderia nos dizer qual magia está escrito nele?
— Não. — Ele nem sequer olhou para ela. — Se você fosse capturada e dissesse aos goblins, e depois? Você saberá o que é quando eu o usar.
— …Você não gosta de mim, não é?
— Não tenho nada em particular.
— Não é apenas uma maneira de dizer que não se importa?
— Não quero dizer mais do que já disse.
A elfa cerrou os dentes e suas orelhas se agitaram de raiva.
— Desista, orelhuda. Ele é mais teimoso que eu. — O anão riu alegremente. — Ele é Corta-barba, afinal.
— Você quer dizer Orcbolg.
— Eu sou Matador de Goblins — murmurou ele.
A elfa franziu a testa com isso, e o anão acariciou sua barba, se divertindo.
— Hum, perdão — interrompeu Sacerdotisa — mas o que Orcbolg quer dizer, exatamente?
— É o nome de uma espada que aparece em nossas lendas — disse a elfa. Ela ergueu orgulhosamente o dedo como uma professora instruindo seus alunos. — Era uma lâmina goblincida que brilharia em azul quando um orc… um goblin, estivesse perto.
— Seja dito, no entanto, que foram nós anões quem forjaram ela — interveio Anão Xamã.
A elfa bufou. — E a chamou de “Corta-barba”. Que nome horrível. Os anões podem ter boas cabeças para criação de itens, mas não para mais nada.
— Então, orelhuda, você admite que seu povo não é artesão tão habilidoso quanto o meu é! — Ele deu uma enorme gargalhada. A elfa estufou suas bochechas.
O homem-lagarto revirou bem os olhos, como se não pudesse acreditar no que via, e trocou um olhar com Sacerdotisa. Ela estava começando a entender que essa era sua maneira de fazer uma piada.
Ela também passou a apreciar os argumentos amigáveis. Era assim que os elfos e os anões eram. Sacerdotisa, que estava pela primeira vez com pessoas de outras raças, sabia que nunca poderia confiar nos membros de seu grupo se não os conhecesse. Então ela tentou conversar com eles, e em pouco tempo, eles se tornaram bons amigos.
A fé ancestral do homem-lagarto não se chocava com os ensinamentos da toda-compassiva Mãe Terra. E havia outra garota no grupo de mesma idade que Sacerdotisa, ou pelo menos parecia. Isso a deixou muito à vontade.
Matador de Goblins, por sua vez, não parecia especialmente acolher ou rejeitar qualquer um deles. Mas isso parecia de certo modo ao gosto do anão. O que quer que Matador de Goblins fez que irritou a elfa, ele pareceu gostar de imitar isso.
Esse pequeno grupo estranho tinha se encontrado inesperadamente, e ainda assim, havia uma sensação de que se pertenciam.
Sacerdotisa sentiu um calor incomum se espalhando por ela.
“Ei, quer ir se aventurar com a gente?”
O que não significava que não houvesse nada que espetasse seu coração…
— Ah sim, há uma coisa que estive pensando — disse o homem-lagarto, com sua cauda soando e abrindo o maxilar. O fogo dançava. Antes de fazer sua pergunta, ele fez o estranho gesto das palmas juntas. Ele alegou que era uma expressão de gratidão pela refeição.
— De onde os goblins brotam? Meu avô me disse uma vez de um reino sob à terra…
— Eu — o anão arrotou — ouvi dizer que eles eram rheas ou elfos caídos.
— Que preconceito! — Alta-Elfa Arqueira olhou feio para Anão Xamã. — Me foi ensinada que os goblins são o que se torna os anões que ficam obcecados por ouro.
— Preconceito, de fato! — O anão olhou triunfantemente para a elfa, que balançou ligeiramente a cabeça.
— Ora, ora, nosso sacerdote não disse que eles vieram de debaixo da terra? E não é de onde os anões vem?
— Grrr…! — O anão só pôde ranger os dentes sobre isso. A elfa deu uma risadinha satisfeita. O homem-lagarto, é claro, lambeu o nariz com a língua.
— Eu disse sob à terra, mas não de elfos ou anões. Que histórias os humanos dizem, Sacerdotisa?
—Ah, hum… — Sacerdotisa estava no meio do caminho de reunir a louça de todos e limpar. Ela deixou o trabalho de lado e se endireitou, colocando as mãos sobre os joelhos. — Temos um ditado que diz que quando alguém falha em algo, um goblin aparece.
— O que?! — A elfa riu.
Sacerdotisa assentiu com um sorriso. — É apenas uma forma de ensinar boas maneiras. Se você não fizer isso ou aquilo, um goblin virá atrás de você!
— Isso parece de fato uma notícia sombria, garota! — disse o anão. — Porque, só a orelhuda responderia por um exército de goblins!
— Ei! — As orelhas da elfa se apontaram para trás. — Que rude. Aguarde só até amanhã. Você verá se alguma de minhas flechas falharão em acertar o alvo.
— Ah, elas vão acertar em alguma coisa, com certeza… temo que elas me acertem, bem na parte de trás!
— Está bem. Anõezinhos são bem-vindos para se esconderem atrás de mim.
— Com certeza irei! Você é uma patrulheira, não é? Um pouco de exploração ajudaria todos nós — disse o anão, afagando a barba com um sorriso malicioso.
A elfa levantou o braço e parecia prestes a responder, quando uma única palavra murmurada passou entre eles. — Eu…
Naturalmente, a atenção do grupo se voltou para a origem.
— Eu ouvi dizer que eles vêm da lua — disse Matador de Goblins.
— Da “lua”, você se refere a uma das duas do nosso céu? — perguntou o homem-lagarto.
— Sim. — Matador de Goblins assentiu. — A verde. Rochas verdes, monstros verdes.
— Bem, nunca pensei que eles poderiam ter vindo sobre minha cabeça — disse o anão com um longo e pensativo suspiro.
Com grande interesse, a elfa perguntou: — Então, as estrelas cadentes são goblins vindo até aqui?
— Não sei. Mas não há grama, árvores ou água na lua. Só rochas. É um lugar solitário — disse ele, serenamente. — Eles não gostam de lá. Eles querem um lugar melhor. Eles têm inveja de nós, com ciúmes, eles descem aqui.
— Aqui?
— Sim. — Ele assentiu. — Então quando você fica com ciúmes, você se torna um goblin.
— Entendi — disse a elfa com um suspiro decepcionado. — Outra historinha para ensinar as crianças boas maneiras.
— Hum, quem te contou essa história? — perguntou Sacerdotisa, se inclinando um pouco para frente. Ele sempre foi tão realista e racional. Esse tipo de história parecia o contrário dele.
— Minha irmã mais velha.
— Oh, você tem uma irmã mais velha?
Ele assentiu. — Tive.
Sacerdotisa sorriu suavemente. O pensamento desse aventureiro durão sendo repreendido por sua irmã era de alguma forma animador.
— Então — pressionou a elfa — você realmente acredita que os goblins vêm da lua?
Matador de Goblins assentiu ligeiramente.
— Tudo o que sei — disse ele, encarando os dois globos no céu — é que minha irmã nunca esteve errada. Sobre qualquer coisa.
Com isso, ele ficou em silêncio. A fogueira crepitou. Com suas orelhas compridas, a elfa detectou uma pitada de suspiro.
Ela aproximou silenciosamente o seu rosto do capacete de Matador de Goblins. Ela ainda não conseguia ver sua expressão. Um sorriso travesso se espalhou pelo seu rosto. — Pfft. Ele adormeceu!
— Oh-ho, o vinho de fogo finalmente o apanhou, não é? — O anão estava só agitando a última gota da garrafa.
— Pensando nisso, ele teve a sua quota-parte dessa coisa, não é?
Sacerdotisa pegou um cobertor de seu equipamento e colocou cuidadosamente sobre ele. Bem gentilmente, ela tocou a armadura de couro no peito dele. Ela também estava cansada, mas ele precisava descansar.
— Vamos também, precisamos do nosso repouso — disse o homem-lagarto solenemente. — E vamos determinar a vigia. Uma boa noite de sono por si só é uma arma em nosso arsenal.
Sacerdotisa, a elfa e o anão se ofereceram para o turno.
Quando ela se aconchegou debaixo de seu cobertor, a elfa roubou um olhar em Matador de Goblins. — Hmm — murmurou ela para si mesma. — Dizem que um animal selvagem nunca dorme na frente daqueles em que não confia…
Para seu próprio desconforto, ela achou que isso a inspirou um ligeiro brilho de felicidade.

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